quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Literatura e Cristianismo: aproximação e distanciamento

Paula Galvão

Com um caráter transformador, a Literatura impressiona a muitos pela sua qualidade artística, englobando várias temáticas reelaboradas de maneira subjetiva, a ponto de até reescrever uma história, ou um simples fato, segundo a concepção do escritor. È, nesse sentido, que adentramos em um fato histórico, que abrange o mundo inteiro: o Cristianismo.
A relação do Cristianismo com a Literatura data desde muitos séculos, a partir do nascimento de Jesus. Tomemos como exemplo a época renascentista, e até mesmo antes desta, a temática cristã já aflorava nos mais variados gêneros textuais, como o teatral, que objetivava a educação cristã dos fiéis.
O Barroco é a principal fonte que une este laço literário-cristão. È importante também levar em conta o contexto histórico de cada período literário. A arte barroca floresceu no tempo em que se discutiam os propósitos da Reforma e Contra – Reforma, assuntos indiscutivelmente ligados à religião, que consequentemente se refletiram na Literatura da época. Gregório de Matos e o Padre Antônio Vieira exploraram em seus textos toda a aproximação possível com o Cristianismo, produções que, por sinal, são de grande valia e riqueza poética.
Mas toda essa aproximação da Literatura com o Cristianismo não se restringe somente em “agradar” leitores religiosos, mas provocar, em algumas circunstâncias, justamente o contrário. Foi o que ocorreu na Pós-Modernidade, quando o autor português José Saramago intitulou uma obra considerada paródia da Bíblia Sagrada de “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”, que mais parece para alguns, “O Evangelho Segundo Saramago”, onde relata a trajetória de Jesus Cristo, em uma postura pagã, com um destino cruel, estipulado por um Deus vingativo e desejoso de sangue humano.
Entretanto, gera-se uma dúvida nos pensamentos dos leitores: a obra de José Saramago retrata uma aproximação ou um total distanciamento do Cristianismo? Para muitos estudiosos, como o Doutor em Filosofia da Educação, Gabriel Perissé, essas questões estão de fato interligadas, pois a proximidade está na temática (Jesus, Bíblia, Deus etc.) e a distancia no desenrolar do enredo. Quanto à polêmica da obra, Perissé diz que: “Os cristãos não devem rejeitar as grandes obras literárias, mesmo aquelas assumidamente atéias e aparentemente ofensivas ao Cristianismo. Elas também revelam a glória e o poder do Criador. Diante de uma obra de arte, seja um livro, um quadro ou um filme, o cristão deve adotar uma atitude de ‘contemplação’, a fim de perceber nela o que há de revelador do sagrado”.
Qualquer distanciamento do Cristianismo perante a Literatura vale-se, sobretudo de temas pagãos, como é notável em alguns movimentos literários, como o Realismo, no qual teorias filosóficas e científicas amenizaram o poder religioso que a ideologia cristã impunha na mente das pessoas.
Alguns ainda podem se perguntar se existe de fato uma certa distancia entre estes dois termos tão discutidos aqui. É importante lembrar que nem todos os períodos literários fizeram forte uso da temática cristã, mas causaram, de algum modo, um impacto nesta Doutrina, através de suas produções. Portanto, é válido dizer que a arte literária e o Cristianismo se distanciam em partes; quanto mais procuram esse distanciamento, mais se aproximam, mesmo de forma inconsciente, pois produzir algo que venha contra os ideais cristãos, com a tentativa de “obrigar a esquecer”, mesmo por um breve momento essa concepção religiosa, leva aos leitores a refletirem sobre a mesma, seja pelo seu lado bom e satisfatório, seja pelo seu lado mais crítico e afrontador. O Cristianismo tornou-se uma ideologia para as pessoas, mesmo para aquelas que se julgam atéias. Isto, de fato, se reflete em todos os movimentos artísticos, e a Literatura, por sua vez, não foge a este princípio.

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