segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Conto: parte 2

Até hoje não sei o motivo de aquela senhora ter me procurado. E esse é um mistério que carregarei até o fim de minha vida. Mais isso, já não tem nenhuma importância. Depois que a velha saiu eu fiquei durante horas pensando a respeito de ter ou não a criança. Ficava imaginando como eu iria sustentar meu filho sem ter um emprego, porque ninguém me empregaria grávida. Ou mesmo onde nós iríamos morar, porque eu não conhecia nenhum outro parente que nos desse abrigo.
Mas por outro lado, sabia que o bebê não tinha culpa nenhuma e que eu não poderia responsabilizá-lo pelos meus atos. Existia alguma parte em mim que queria o bebê, talvez a mesma inocência que me fez acreditar naquele amor dos dezesseis anos. Quando pensava em ter meu filho nos meus braços eu ficava muito feliz a ponto de desistir daquela maldita idéia. Dos raros momentos que tive com Ricardo, ainda posso sentir seu cheiro e como ele era carinhoso. Talvez nós não soubéssemos o que estava nos acontecendo, afinal estávamos acometidos pelo primeiro amor. E a primeira paixão sempre carrega a inocência, a curiosidade a busca pelo desconhecido. As recordações que pude guardar do pai do meu filho foram poucas, pois foi apenas num único encontro que tudo aconteceu.
Foram os momentos mais tensos de minha vida. Apesar de ser uma menina, eu não queria que meu filho crescesse sem a presença de um pai, pois eu sabia bem o que significava não conhecer o próprio pai, ao menos ele teria uma mãe. E eu apesar de ter sido criada por familiares, na verdade nunca recebi carinho de um pai nem de uma mãe.
Eu ficava imaginando se o Ricardo voltasse, nós nos casaríamos e teríamos nosso filho e talvez muitos filhos e viveríamos naquela cidade até a nossa velhice. Mas tudo isso não passava de um sonho, pois eu sabia que nunca mais o veria de novo.
Ao anoitecer Dona Zica chega com as ervas e logo perguntou se tinha alguém em casa, eu disse que estava sozinha, pois meus tios tinham ido à igreja e só iriam chegar mais tarde. Ao ouvir essas palavras à velha foi imediatamente para cozinha para preparar o chá. E eu apressadamente lhe acompanhei. Ficava procurando as palavras de como lhe falar que eu havia desistido do plano. Eu achava essa palavra tão inescrupulosa para qualificar o que estava acontecendo, mas talvez eu fosse isso mesmo, pois nada justificaria minha escolha.
Chegando lá eu perguntei se ela precisava de ajuda. Ela respondeu dizendo que não, pois a receita era simples, bastava misturar todas as plantas, acrescentando água e depois colocar no fogo e num tempo de quatro horas a gororoba estaria pronta. E foi nesse momento que percebi que não se tratava de um simples chá.
Foi então quando tomei coragem para lhe falar que eu queria ter a criança. Dona Zica ficou espantada e disse que eu estava louca. Como eu poderia criar um bebê sendo tão ingênua e inexperiente. É que eu tinha sido enganada pelo primeiro calhorda que apareceu na frente e minha imaturidade só iria maltratar o bebê.
Ela ainda me chamou de ingrata, pois ela era a única pessoa que realmente estava tentando me ajudar. E que eu era muito ingênua para perceber que a vida não era tão simples como imaginava, pois eu ainda não tinha deixado de ser uma menina, inocente e indefesa. O mundo é cruel para todos, mas é mais cruel para os frágeis.
Depois de todo esse sermão eu resolvi ouvir os conselhos daquela velha senhora. Afinal ela era a única pessoa que me apoiava e que sabia do meu drama. Ela pediu que eu esperasse no quarto e que quando estivesse pronto ela levaria até lá.
Passadas algumas horas, Dona Zica chega com um litro cheio do líquido para eu tomar. Eu pedi a ela que deixasse em cima da mesa. Ela disse que ia embora porque não queria que meus tios a visse, e também que se eu precisasse de alguma coisa era só procurá-la na sua casa.
Depois que ela saiu eu comecei a sentir fortes dores. Eu deitei na cama e percebi que estava com hemorragia. Tia Diná e tio Casé tinham acabado de chegar da missa e ouviram meus gritos. Eles mandaram chamar uma amiga enfermeira da tia Diná. Ela disse que eu tinha perdido o bebê e que não precisavam se preocupar comigo, pois iria ficar bem.
Após esse episódio eu decidi ir embora para a cidade grande. E lá recomeçar minha vida.

Autora: Marcela Lima

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