segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Conto: parte 1

Quando eu era uma menina


Eu morava numa cidade pequena, pacata e solitária. Lá moravam poucas pessoas. A vila era constituída basicamente pela igreja e por uma praça. Há, tinha uma escola que eu estudava que se chamava Santiago dos Reis. Nessa época eu devia ter uns dezesseis anos e morava na casa dos meus tios, meus pais haviam morrido quando ainda era criança e por isso não guardava nenhuma recordação deles.
Não lembro de muita coisa, pois à distância ou o tempo às vezes nos fazem esquecer coisas que nos fizeram sofrer. Afinal já faz muito tempo e hoje sou apenas uma garota mulher que se recorda de um passado que um dia foi um presente triste.
Tinha um garoto na escola por quem eu era apaixonada, ele era um pouco magro e tinha os olhos grandes e cabelos claros, não sei bem ao certo, mas o garoto aparentava ter menos de vinte anos.
Eu era muito menina nunca havia namorado e talvez não soubesse nem o que era beijar. Naquela época as famílias não conversavam em casa com seus filhos sobre esses assuntos. Talvez eles passassem uma educação que seus pais lhe deram e não percebiam que a vida e o tempo nunca são o mesmo.
O rapaz de olhos graduados se chamava Ricardo. A primeira vez que nos encontramos foi atrás da escola. Lá foi também meu primeiro beijo.
No outro dia quando fui procurá-lo na escola soube que ele tinha ido embora para outra cidade, pois seus pais o tinha transferido para uma escola de mais prestígio que aquela. Depois daquele encontro sabia que nunca mais o veria, pois sabia que o meu destino estaria preso àquela velha cidade.
Algumas semanas se passaram e eu me sentia como se estivesse doente, mas o que me afligia eram apenas saudades. O meu quarto era escuro e pequeno. Nele só tinha uma cama e alguns quadros meus. Naquele tempo eu gostava de pintar, talvez porque eu fosse apenas uma garota.
Não tinha nenhum médico que morasse na vila, por isso eu tinha que esperar todo mês a visita do doutor Sião. Ninguém sabia o que eu tinha. Sentia enjôos, e muito sono e a minha menstruação fazia dois meses que não vinha.
No mês seguinte o médico disse que eu estava grávida. Tia Diná e tio Casé quiseram me bater, mas não podiam se não matariam meu filho. Desde desse dia não sai mais do quarto, pois não tinha coragem de enfrentar as pessoas na rua. Uma vez sai para comprar um chocolate e uma senhora me apontou o dedo como se eu fosse uma criminosa.
A partir daí não tinha mais forças para viver. Meus tios haviam me dito que eu só ficaria na casa até o bebê nascer e depois eu teria que procurar outro local para morar, pois sua casa não aceitava filho de mulher solteira.
Eu não podia nem mais pintar, pois a tinta poderia fazer mal para a criança. Certo dia eu recebi a visita de uma senhora que aparentava já ser de idade. Nesse dia eu estava só em casa. A primeira coisa que lembro dela é o seu nome, ela se chamava dona Zica. Eu já tinha ouvido falar sobre ela. A maioria das pessoas não gostava dela, porque diziam que ela era uma velha curandeira e que ela tinha contato com os espíritos.
Uma da muitas histórias que o povo comentava foi que certa vez um homem chegou a sua casa e pediu que ela lhe ajudasse a descobrir que doença tinha sua filha. A velha passou umas ervas e disse que a menina iria se curar caso tomasse aquele remédio. E foi o que aconteceu.
Quando ela chegou ao meu quarto foi logo me perguntando se eu queria o bebê. Eu respondi dizendo que estava meio confusa, pois não sabia como iria criar a criança, pois não tinha apoio da família e o pai da criança tinha ido embora e eu não tinha como entrar em contato com ele.
Dona Zica me disse que sabia o que fazer para que eu não tivesse o bebê. Então, ela me indicou umas plantas e disse o local onde eu poderia comprá-las, e que se eu quisesse, ela poderia ir comprar e preparar o chá para mim. Eu não sabia o que responder, mas no impulso disse a ela que aceitava.
Quando olhei no relógio já era quase à hora do almoço e pedi a senhora que fosse embora, pois meus tios viriam para casa. A velha saiu e disse que quando voltasse já traria as ervas e que eu não precisava me preocupar quanto ao dinheiro, porque ela conhecia um senhor que poderia lhe fornecer a planta sem precisar pagar, pois o homem lhe devia uma dívida.

Autora: Marcela Lima

Nenhum comentário: